O que é a pele atópica e como tratar?
- Pele atópica e eczema atópico são termos muitas vezes utilizados para se referir à mesma doença, porém é importante fazer a distinção entre os dois. O eczema atópico é uma doença inflamatória crónica, enquanto que a pele atópica é uma forma agravada de pele muito seca.
- Alguns dos sintomas do eczema atópico são pele seca, comichão intensa e lesões cutâneas.
- É importante fazer a manutenção do tratamento para repor a barreira da pele e reforçar a gordura da pele, através de cremes, produtos com pouco sabão, manter a pele fresca ou de medicamentos prescritos pelo médico.
O eczema atópico é a infeção cutânea mais frequente na infância, pelo que importa saber o que é, como prevenir e tratar. Muitos são os cremes à venda na farmácia para tratar aquilo que habitualmente se designa por pele atópica. Mas será que estamos todos a falar do mesmo? O dermatologista João Maia e Silva dá uma ajuda.
Pele seca, pequenas borbulhas, comichão intensa e vermelhidão na zona da erupção. Estes são apenas alguns dos sintomas que levam a maior parte dos médicos a diagnosticar pele atópica. Porém, como adverte João Maia e Silva, dermatologista, “há que distinguir entre eczema atópico e pele atópica, pois são coisas diferentes”. Assim, “o eczema atópico é uma doença inflamatória crónica que se caracteriza essencialmente por duas coisas: por um lado, a função de barreira da pele não funciona de forma adequada e, por outro, há uma hiper-reactividade do nosso sistema imunitário, ou seja, ele reage a tudo com muita facilidade”.
Para melhor clarificar a importância da função de barreira da pele, o médico recorre a um exemplo: “Imagine o que é uma parede com tijolo, cimento e reboco. No caso destas peles, o tijolo e o cimento são de má qualidade e o reboco é muito pouco. Isto faz com que a água que está dentro do nosso corpo, na nossa pele, mais facilmente atravesse a camada superficial, a epiderme – que é onde estão estes defeitos –, acabando por evaporar e secar a pele. Como consequência, tudo o que está no exterior mais facilmente vai penetrar e irritar.”
Ao mesmo tempo, verifica-se nestas pessoas a já referida hiper-reactividade do sistema imunitário, isto é, “tudo o que penetra no organismo, mesmo coisas que teríamos obrigação de interpretar como normais e tolerá-las, vai provocar uma irritação maior do que seria de esperar”, explica o especialista. Além deste quadro, verifica-se ainda “a reatividade dos brônquios – com asma – e a reatividade ao nível da mucosa nasal – a rinite. Aliás, “é comum que estes sintomas respiratórios até surjam antes de haver um problema na pele”, refere.
Porém, a presença de eczema atópico – a inflamação crónica da pele – nem sempre é clara, sobretudo quando alguns sintomas estão presentes, mas outros não. E é aqui que a distinção se torna mais difícil: “Às vezes isto não é assim tão claro. A pele é um pouco reativa e seca, mas a pessoa não tem asma nem rinite, ou seja, não tem muita reatividade nem apresenta alergias bem definidas, mas tem uma pele sensível e aquilo parece eczema atópico, mas não é, e então aí temos a pele atópica.”
Crianças mais afetadas
O eczema atópico constitui a infeção da pele mais comum na infância, estimando-se que atinja cerca de 20% de crianças com menos de sete anos. À medida que a idade aumenta, diminuem ou até desaparecem os sintomas. João Maia e Silva esclarece como é que este problema de saúde evolui com a idade: “Nos primeiros meses de vida, o nosso sistema imunitário não está suficientemente amadurecido para dar origem ao eczema atópico.” Por este motivo, a situação só começa a manifestar-se por volta dos três ou quatro meses, “pois é quando o corpo já percebe o que é, ou não, normal e começa a reagir”.
Quando a criança é muito pequena, a inflamação aparece sobretudo nas faces, nas grandes pregas e no tronco, mas conforme se vai tornando mais autónoma – gatinha e brinca – as lesões por fricção vão surgindo e passam a aparecer também nos joelhos e cotovelos. Outra localização comum é a zona da fralda. O dermatologista lembra que “aqui o problema é o eczema irritativo da fralda, mas como a criança já tem o eczema atópico, então há maior probabilidade de aquela situação acontecer”. Com o crescimento, o eczema vai ficando localizado sobretudo nas grandes pregas, atrás dos joelhos e na parte da frente dos cotovelos. Com a idade adulta, mantém-se nas grandes pregas e tende a surgir “em zonas de traumatismo, nomeadamente, relacionadas com o trabalho que a pessoa desenvolve, que são zonas mais sujeitas à irritação”, afirma.
Quanto à evolução deste problema de saúde ao longo do tempo, observa-se que “por volta dos cinco ou seis anos de idade, o eczema atópico desaparece nalguns casos, enquanto noutros desaparece na adolescência. E depois há uma percentagem mais pequena de indivíduos que o leva para a idade adulta”. Ao longo dos anos, aquilo que muda na pele e que vai fazer com que o problema possa desaparecer prende-se especialmente com a função de barreira: “A pele do adolescente produz gordura e essa gordura é a barreira, ou seja, é o reboco da parede. E logo que entra na adolescência começa a ganhar mais reboco, isto é, há uma alteração das características da pele, que faz com que tenha menos eczema atópico.”
Superproteção aumenta risco
Mas se alguns fatores ajudam a que o eczema atópico melhore, outros há que fazem precisamente o oposto. Além dos já referidos fatores externos relacionados com a fralda ou com a vida profissional do adulto (por exemplo, se lida diariamente com produtos aos quais é alérgico), o médico chama a atenção para o caso de “crianças muito agasalhadas com camisolas de lã ou sintéticas, as quais vão depois irritar no sítio dos contactos”.
Outro fator que leva a que o eczema atópico seja mais frequente nos mais novos relaciona-se com a tendência para a sua superproteção, nomeadamente, não os deixando brincar em contextos que não sejam asséticos. “Um dia mais tarde, eles vão entrar em contacto com a terra e o pó e, nessa altura, o seu organismo já não tem capacidade de adaptação e vai entender aquilo tudo como estranho”, afirma, acrescentando que é por essa razão também que “as crianças têm mais eczema atópico quando são de estratos económicos mais altos, vivem nas cidades e tomam mais antibióticos”. Além disso, também as crianças que são filhas de pais que fumam tendem a desenvolver esta inflamação cutânea com mais frequência.
Cuidado com temperatura, bactérias e vírus
Outro aspeto que influencia igualmente a intensidade do eczema é a temperatura: climas muito frios e secos podem agravar, assim como o calor com humidade. Além disso, o médico destaca o stress e ainda a infeção por algumas bactérias e vírus. A este respeito, alerta para a necessidade de as crianças terem sempre as unhas bem cortadas e limpas, “pois tendem a coçar-se e, se as unhas estiverem sujas, as feridas podem infetar”. Atenção também para alguns vírus, já que “há alguns que penetram mais facilmente nesta pele, como é o caso do molusco contagioso, muito comum nas crianças com eczema atópico que frequentam piscinas”.
Cuidar e prevenir sempre
Quanto ao tratamento do eczema atópico, o médico começa por salientar a necessidade de se repor a função de barreira da pele, ou seja, “atuando no reboco”. Como? “Dando banhos pouco demorados, com água pouco quente e com produtos que não tenham sabão e façam pouca espuma para não retirar a pouca gordura que estas peles têm.” Além disso, há que reforçar esta gordura através de um creme que a contenha e que, ao mesmo tempo, crie uma película sobre a pele, de maneira que a água aqui presente não se evapore.
Outros cuidados passam por manter a pele fresca, não agasalhar em demasia, vestir roupa de algodão e usar água termal para acalmar a comichão. Por vezes, é necessário recorrer a medicamentos prescritos pelo médico, nomeadamente, anti-histamínicos e, em situações mais graves, cremes anti-inflamatórios com ou sem corticoides. Quando nem estes últimos funcionam, poderá haver necessidade de tomar imunossupressores.
De acordo com João Maia e Silva, a maior dificuldade no tratamento do eczema não é tanto o controlo imediato das queixas, porque a crise resolve-se sempre. “A principal questão é manter a pessoa sempre bem e para isso não se pode deixar de fazer todos os procedimentos só porque a pessoa está bem naquele momento”, afirma, sublinhando que “se não se perceber bem isto, o problema volta rapidamente”. “Os cuidados têm de ser contínuos e, às vezes, até o uso dos próprios medicamentos. Há que privilegiar a manutenção”, salienta.
Outra chamada de atenção prende-se com os cremes hidratantes usados. Mudar constantemente de produto é errado, “porque estamos a expor a pessoa a muitos químicos”. “A boa recomendação é que se a pessoa se dá bem com determinado creme deverá usar esse e ponto final. Tem é de o pôr e manter os restantes cuidados.”
Sintomas de eczema atópico
- Pele seca
- Borbulhinhas tipo “pele de galinha”
- Comichão intensa (que agrava com a transpiração e o aquecimento corporal)
- Alterações da cor da pele
- Pele muito espessa (textura tipo “couro”)
- Vermelhidão ou inflamação ao redor das bolhas
- Lesões cutâneas
- Asma e/ou Rinite
Sabia que...
A palavra “atopia” – utilizada com frequência para descrever o conjunto de sintomas apresentados por quem sofre de eczema atópico – deriva do grego e significa “coisa estranha, fora do lugar”.
Conteúdo revisto
pelo Conselho Científico da AdvanceCare.
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