A leucemia é um cancro das células primitivas da medula óssea, as células estaminais – que dão origem às células do sangue (as células maduras formam-se a partir das células estaminais).
A medula óssea é o órgão onde se formam as células do sangue. Nas leucemias, as células doentes (fabricadas na medula) vão transbordar para o sangue, passando a encontrar-se na circulação sanguínea.
A leucemia surge quando se dá uma transformação anormal no processo de amadurecimento da célula-mãe (o processo em que a célula mãe dá origem ao glóbulo branco). Esta alteração vem perturbar o controlo normal da divisão celular, pelo que as células afetadas se multiplicam sem cessar, ocupando toda a medula óssea, acabando por substituir as células que produzem as células sanguíneas normais. Estas células leucémicas (cancerosas) libertam-se no fluxo sanguíneo e são transportadas para o fígado, baço, gânglios linfáticos, cérebro, rins e órgãos reprodutores, onde continuam a crescer e a dividir-se. Podem irritar a membrana que recobre o cérebro, causando meningite, podendo causar anemia, insuficiência hepática e renal ou lesar outros órgãos.
Existem quatro tipos principais de leucemia, denominados em função da velocidade de progressão e do tipo de glóbulos brancos que afetam:
- Leucemias agudas – progridem rapidamente.
- Leucemias crónicas – progridem de forma lenta.
- Leucemias linfáticas – afetam os linfócitos.
- Leucemias mieloides (mielocíticas) – afetam os mielócitos.
A maioria das leucemias desenvolve-se a partir das células que vão dar origem aos glóbulos brancos.
Causas de Leucemia
A causa da maioria dos tipos de leucemia ainda é desconhecida. Suspeita-se que o vírus linfotrópico da célula T humana (HTLV-I), semelhante ao vírus que provoca a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (SIDA), possa ser a causa de um tipo raro de leucemia nos humanos, chamada Leucemia da Célula T do adulto. A exposição à radiação e a certas substâncias químicas, como o benzeno, assim como o uso de alguns medicamentos anticancerígenos aumentam o risco de leucemia. Pessoas com determinadas perturbações genéticas, como a Síndrome de Down e a Síndrome de Fanconi, apresentam maior risco de leucemia.
Leucemia linfática aguda
A leucemia linfática aguda é o cancro mais frequente nas crianças, abrange 25% de todos os cancros em crianças menores de 15 anos. Geralmente afeta as crianças entre os 3 e os 5 anos de idade, mas também se encontra presente nos adolescentes e, com menos frequência, nos adultos.
Sintomas
Os primeiros sintomas aparecem porque a medula óssea é incapaz de produzir células sanguíneas normais em número suficiente, o que provoca sintomas como:
- Fraqueza.
- Falta de ar.
- Anemia (como consequência da falta de glóbulos vermelhos).
- Infeções e febre (como consequência da falta de glóbulos brancos normais).
- Hemorragia (como consequência da falta de plaquetas).
- Em algumas pessoas, a doença pode revelar-se através de uma infeção grave. Contudo, a sua manifestação pode ser mais subtil, com fraqueza progressiva, fadiga e palidez. A hemorragia apresenta-se como epistaxe (sangue pelo nariz), gengivas que sangram com facilidade, manchas superficiais de tipo púrpura, nódoas negras e tendência para os hematomas. As células leucémicas que se encontram no cérebro podem provocar cefaleias, vómitos e irritabilidade. A afeção da medula óssea pode causar dor óssea e articular.
Tratamento
As alterações nas análises de sangue comuns, como a contagem completa de células sanguíneas, podem constituir o primeiro sinal de leucemia. Na leucemia, o número total de glóbulos brancos oscila entre o baixo, o normal e o elevado, mas a quantidade de glóbulos vermelhos e plaquetas é quase sempre baixa. Quando existe uma leucemia, o exame microscópico das amostras de sangue revela a presença de glóbulos brancos muito imaturos (blastos) no sangue, o que, em condições normais, nunca acontece. A sua presença é suficiente para diagnosticar leucemia. A confirmação do diagnóstico faz-se através de biópsia da medula óssea, o que permite também determinar qual o tipo de leucemia.
- Em mais de 90% dos doentes que sofrem de leucemia linfática aguda (habitualmente crianças), a doença entra em remissão após o primeiro ciclo de quimioterapia. Destas crianças, 50% não apresentam qualquer traço de leucemia 5 anos após o tratamento. As crianças entre os 3 e os 7 anos são as que têm o melhor prognóstico, contudo há muitos casos em que a doença volta a aparecer (recidiva). Os doentes com idade superior a 20 anos apresentam, contudo, um prognóstico mais reservado.
- As crianças ou os adultos cujos glóbulos brancos iniciais sejam inferiores a 25 000 por microlitro de sangue, apresentam melhor prognóstico do que aqueles que apresentam um valor inicial de glóbulos brancos mais elevado.
- O tratamento visa conseguir a remissão completa da doença mediante a destruição das células leucémicas, de forma que as células normais voltem a crescer na medula óssea. Os indivíduos submetidos a quimioterapia podem requerer hospitalização durante alguns dias ou semanas, dependendo da rapidez com que a medula óssea recupere. Antes que o funcionamento da medula óssea volte à normalidade, pode ser necessário realizar transfusões de glóbulos vermelhos (para tratar a anemia), transfusões de plaquetas (para tratar a hemorragia) e administrar antibióticos (para tratar as infeções).
- Semanas ou meses depois do tratamento inicial intensivo, dirigido à destruição das células leucémicas, administra-se um tratamento adicional (quimioterapia de consolidação) a fim de destruir qualquer célula leucémica residual. O tratamento pode durar de 2 a 3 anos, embora alguns sejam um pouco menos prolongados.
As células leucémicas podem reaparecer ao fim algum tempo (recidiva), na medula óssea, no cérebro ou nos testículos, sendo a recorrência de células leucémicas na medula óssea, particularmente grave. Nos casos em que isto acontece, os doentes são novamente sujeitos a quimioterapia. Uma vez nesta fase, mesmo que a doença desapareça, há maiores probabilidades de reaparecer mais tarde. Nestas situações, o transplante da medula óssea apresenta-se como a melhor solução para estes doentes, oferecendo a melhor oportunidade de recuperação. Contudo, este procedimento só pode realizar-se se for possível obter a medula óssea de uma pessoa que tenha um tipo de tecido compatível (HLA-compatível), quase sempre proveniente de um familiar próximo.
Quando as células leucémicas recidivam no cérebro, procede-se à injeção de quimioterapia no líquido da espinal medula uma ou duas vezes por semana.
O tratamento da recorrência no testículo consiste no recurso à quimioterapia e radioterapia.
Leucemia mieloide aguda
A leucemia mieloide aguda é uma doença potencialmente mortal, na qual os mielócitos (as células que normalmente se transformam em granulócitos) sofrem uma transformação (tornando-se cancerígenas) e substituindo rapidamente as células normais da medula óssea. Estas células são libertadas na circulação sanguínea e transportadas para outros órgãos, onde continuam a crescer e a dividir-se. Podem originar tumores pequenos (cloromas) na pele, assim como provocar meningite, anemia, insuficiência renal e hepática ou lesar qualquer outro órgão.
Este tipo de leucemia afeta pessoas de todas as idades, mas principalmente os adultos. A exposição a doses elevadas de radiação e o uso de quimioterapia contra outro tipo de cancro, aumentam a probabilidade de leucemia mieloide.
Sintomas
Os primeiros sintomas manifestam-se, normalmente, como uma incapacidade da medula óssea em produzir suficientes células sanguíneas normais. Os sintomas são:
- Fraqueza.
- Falta de ar.
- Infeção.
- Febre.
- Hemorragia.
- Outros sintomas incluem dores de cabeça, vómitos, irritabilidade e dor nos ossos e articulações.
- O diagnóstico da leucemia mieloide aguda é realizado de forma idêntica ao da leucemia linfática aguda.
Tratamento
Entre 50% e 80% dos doentes que sofrem de leucemia mieloide aguda respondem positivamente ao tratamento, sendo que entre 20% a 40% das pessoas não manifestam qualquer sinal da doença 5 anos após o tratamento. O transplante de medula óssea aumenta a probabilidade de sucesso em 40% a 50% dos doentes. As pessoas com mais de 50 anos que contraem leucemia mieloide aguda após receberem quimioterapia e radiação para o tratamento de outras doenças, apresentam pior prognóstico.
O tratamento visa conseguir a remissão precoce da doença (destruição de todas as células leucémicas). A leucemia mieloide aguda responde a menos medicamentos do que outros tipos de leucemia. Para além disso, uma vez que o tratamento suspende a atividade da medula óssea (o que aumenta a probabilidade de infeção), o estado do doente habitualmente degrada-se, antes de começar a melhorar.
Os cuidados com estes doentes têm de ser redobrados, de forma a evitar infeções com a administração de antibióticos, caso estas se manifestem. Pode ser igualmente necessário efetuar transfusões de glóbulos vermelhos e de plaquetas.
As pessoas cuja doença está em remissão recebem habitualmente quimioterapia adicional (quimioterapia de consolidação) umas semanas ou meses depois do tratamento inicial. Com o objetivo de assegurar a destruição da maior quantidade possível de células leucémicas.
O transplante de medula óssea pode ser uma opção para os doentes que não respondam ao tratamento, bem como para os mais jovens (mesmo que a resposta à primeira fase do tratamento tenha sido positiva), a fim de eliminar as células leucémicas residuais.
Leucemia linfática crónica
A leucemia linfática crónica tem origem nos linfócitos B – glóbulos brancos que são formados na medula óssea. Ao contrário do que acontece na leucemia aguda, estes linfócitos não se multiplicam mais depressa, mas sobrevivem mais tempo. Apesar de microscopicamente normais, estes linfócitos funcionam mal. É uma doença de desenvolvimento lento, cuja sintomatologia pode demorar anos a aparecer.
Este tipo de leucemia caracteriza-se pelo aumento de volume dos gânglios linfáticos. As células cancerígenas estendem-se até ao fígado e ao baço, que começam a aumentar de tamanho. Quando estes linfócitos invadem a medula óssea, expulsam as células normais, diminuem os glóbulos brancos normais e as plaquetas no sangue. A quantidade e a atividade dos anticorpos também diminuem. O sistema imunitário começa a reagir de forma desadequada, destruindo os tecidos normais, o que pode provocar a destruição dos glóbulos vermelhos e das plaquetas, inflamação dos vasos sanguíneos, das articulações (artrite reumatoide) e da glândula tiroide (tiroidite).
Todos os anos surgem cerca de sete mil novos casos de leucemia linfática crónica em Portugal. É o tipo de leucemia mais frequente nos países ocidentais, sendo responsável por cerca de 33% dos casos totais de leucemia. A sua incidência é duas vezes superior nos homens do que nas mulheres, atingindo faixas etárias normalmente acima dos 50 anos de idade.
Sintomas
Os sintomas manifestam-se quando o número de linfócitos doentes se torna muito alto, impedindo a medula de fabricar as outras células saudáveis para a funções normais do sangue. A terapêutica para este tipo de leucemia tem como objetivo baixar o número de glóbulos brancos.
Nos estádios iniciais da afeção, a maioria dos doentes não apresenta qualquer sintoma, salvo gânglios linfáticos aumentados. Os sintomas podem incluir:
- Fadiga.
- Perda de apetite.
- Perda de peso.
- Falta de ar ao fazer uma atividade física.
- Plenitude abdominal (provocada pela hipertrofia do baço).
- As leucemias de células T podem invadir a pele nos primeiros estádios da doença, ocasionando uma erupção pouco comum.
- À medida que a doença avança, os doentes empalidecem e tendem a sofrer hematomas.
- As infeções bacterianas, virais e micóticas manifestam-se nos estádios mais avançados da doença.
Tratamento
A doença pode ser descoberta acidentalmente, aquando da realização de análises sanguíneas que revelam uma quantidade elevada de linfócitos (mais de 5000 por microlitro). Nestas situações, habitualmente faz-se uma biopsia da medula óssea.
A maioria dos tipos de leucemia linfática crónica avança lentamente. O estádio da doença permite prever a possibilidade do doente recuperar. A fase da doença baseia-se em fatores como a quantidade de linfócitos no sangue e na medula óssea, tamanho do baço e fígado, presença ou ausência de anemia e a quantidade de plaquetas.
Os doentes que sofrem de leucemia de células B muitas vezes sobrevivem entre 10 e 20 anos a partir do estabelecimento
do diagnóstico e, habitualmente, não requerem tratamento nos estadios iniciais.
Os doentes muito anémicos
apresentam menor sobrevida do que os menos anémicos e que têm quantidades mais elevadas de plaquetas.
O
prognóstico dos doentes com leucemia de células T é um pouco menos favorável, por razões provavelmente relacionadas
com alterações no sistema imunitário, as pessoas que têm leucemia linfática crónica são mais propensas a contrair
outro tipo de cancros.
Como a leucemia crónica é de desenvolvimento lento, muitos doentes não precisam de
tratamento durante anos. No caso de haver uma baixa contagem de plaquetas realizam-se transfusões de plaquetas e as
infeções tratam-se com antibióticos. A radioterapia usa-se para reduzir o tamanho dos gânglios linfáticos, do fígado
ou do baço, quando o seu crescimento se torna incómodo para o doente.
Leucemia mieloide crónica
A leucemia mieloide crónica (mielocítica, mieloide, granulocítica) afeta pessoas de qualquer idade e sexo, mas é rara em crianças menores de 10 anos. A maioria dos granulócitos leucémicos tem origem na medula óssea, mas alguns são produzidos no baço e no fígado. O processo degenerativo que provoca a doença é semelhante ao da leucemia linfática crónica.
Por vezes, a doença deriva para uma crise blástica, sinal de que a doença se agudizou. Nesse momento, os cloromas (tumores compostos por granulócitos de reprodução rápida) podem aparecer na pele, nos ossos, no cérebro e nos gânglios linfáticos.
Sintomas
Nas fases iniciais, a leucemia mieloide crónica pode ser assintomática. Quando existem, os sintomas são:
- Enfraquecimento e fadiga.
- Perda de apetite.
- Perda de peso.
- Febre e suores noturnos.
- Plenitude abdominal.
- Hipertrofia dos gânglios linfáticos.
- Com o tempo aparecem infeções frequentes, ocasionando palidez, hematomas e hemorragias. A febre, o aumento de volume dos gânglios linfáticos e a formação de nódulos cutâneos com granulócitos leucémicos (cloromas) constituem sinais de alarme.
Tratamento
O diagnóstico da leucemia mieloide crónica estabelece-se frequentemente por meio de uma análise de sangue simples.
Embora a maioria dos tratamentos não cure a doença em si, atrasa a sua progressão. Aproximadamente 20% a 30% dos doentes com leucemia mieloide crónica morre nos dois anos posteriores ao diagnóstico e 25% morrem anualmente depois desse prazo.
Muitos doentes vivem quatro ou mais anos após o diagnóstico, morrendo na fase acelerada ou durante a crise blástica. O tratamento de uma crise blástica é semelhante ao da leucemia linfática aguda. A sobrevivência média depois de uma crise blástica é de apenas 2 meses, mas a quimioterapia ocasionalmente alarga o prazo até aos oito ou 12 meses.
Considera-se que o tratamento foi eficaz quando se consegue reduzir a quantidade de glóbulos brancos a menos de 50 000 por microlitro. O melhor tratamento disponível atualmente não consegue destruir todas as células leucémicas. A única possibilidade de recuperação total é o transplante de medula óssea.
Além dos medicamentos, prescreve-se uma radioterapia do baço para ajudar a reduzir o número de células leucémicas. Por vezes, o baço deve ser extraído cirurgicamente (esplenectomia) para aliviar o mal-estar abdominal, aumentar o número de plaquetas e diminuir a necessidade de transfusões.
Artigo revisto e validado pela especialista em Medicina Geral e Familiar Isabel Braizinha.
Conteúdo revisto
pelo Conselho Científico da AdvanceCare.
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