O cancro explicado às crianças
- Há temas difíceis, como a morte, doenças graves, divórcio, dificuldades financeiras, entre outros assuntos delicados, que nenhum adulto gostaria de ter de abordar com uma criança.
- Ser aberto, sensível e honesto desde o início do processo facilitará a aceitação da criança e dar-lhe-á um maior sentimento de tranquilidade e segurança em momentos de medo e incerteza.
- A abordagem usada deverá sempre adaptar-se à idade, desenvolvimento e personalidade da criança, tendo em conta a sua capacidade de entender o que lhe é transmitido.
O cancro tem um impacto significativo na vida dos doentes e das suas famílias, com consequências que vão muito além do impacto físico e emocional, afetando também a dinâmica social, económica e laboral dos doentes e cuidadores. Por este motivo, a lei estabelece um conjunto de direitos que têm como propósito proteger os doentes durante a doença.
Porém, grande parte dos doentes com cancro não os conhece e, por isso mesmo, a Liga Portuguesa Contra o Cancro condensou a informação relevante de forma concisa, facilitando a sua consulta por doentes, familiares e até profissionais de saúde. Destacamos aqui alguns dos benefícios contemplados na legislação, mas poderá também consultar o Guia dos Direitos Gerais do Doente Oncológico.
Partilha do diagnóstico de cancro com as crianças
- Por que é importante envolver a criança?
Esconder o diagnóstico de cancro de um familiar ou conhecido pode trazer stress e ansiedade tanto aos pais como à criança, que poderá não compreender o que se passa à sua volta, criando as suas próprias interpretações e podendo até conceber cenários mais graves do que a realidade.
A criança pode sentir-se magoada e desvalorizada pela família se descobrir que não foi envolvida neste processo doloroso que irá afetar toda a dinâmica do seu quotidiano. Por esse motivo, a honestidade será sempre a melhor abordagem para as crianças terem tempo de aceitar a nova realidade familiar, e ainda adaptar-se às mudanças que o cancro trará à família.
- Como abordar o tema?
Para introduzir a temática “cancro”, é essencial a criança estar num espaço em que se sinta segura para expressar as suas emoções e, ainda, que sinta que há tempo para ouvir e ser ouvida, sem pressas ou interrupções. Será de evitar que a conversa ocorra à noite, antes de ir dormir, ou de dia antes de algum evento importante, evitando que a criança tenha de refletir sobre o assunto e a lidar com os seus medos sozinha.
Dada a sensibilidade do tema, é essencial planear o que se vai dizer, pesquisando informação sobre o cancro e informando-se junto da equipa médica ou profissionais. Se necessário, recorra a apoio psicológico para o processo.
Além de explicar a doença e o seu processo de tratamento, também devem ser exploradas as alterações que vão ocorrer no seio familiar e na rotina do dia a dia. Assegurando sempre à criança, de que existe um plano e que, apesar das dificuldades, procurar-se-ão as melhores soluções para todos os elementos da família.
Outro aspeto a ter em conta é o equilíbrio entre a realidade e o bom senso, tendo sempre por base a honestidade, mas procurando em todos os momentos reforçar a segurança da criança, garantindo que, independentemente do desfecho, esta nunca ficará sozinha.
É também importante criar abertura para que aconteçam outros diálogos, pois surgirão mais dúvidas e a criança necessitará de mais momentos para expor as suas questões.
Para esta temática, a Liga Portuguesa Contra o Cancro, com o apoio da MSD, criou um audiolivro infantil com o objetivo de explicar a doença às crianças de uma forma mais lúdica.
- Até onde se deve aprofundar a informação?
A sinceridade é essencial, assim como a abertura para que a criança possa esclarecer todas as suas dúvidas. Porém, este diálogo deve começar por expor pequenas quantidades de informação, perceber efetivamente o que a criança quer saber, e ir respondendo consoante as perguntas que a criança for apresentando.
As preocupações e dúvidas dos mais pequenos não são as mesmas que as de um adulto, por isso deve-se perguntar diretamente à criança o que quer saber e clarificar os seus mitos e medos. À medida que o tempo passa e a criança assimila a informação, é possível ir introduzindo mais detalhes se necessário.
O que a criança compreende e quer saber depende da idade, maturidade e personalidade, mas também das suas próprias experiências, devendo, por isso, adaptar-se a abordagem à capacidade da criança de entender o que lhe é transmitido.
Os diferentes cenários
- Quando outra criança é diagnosticada com cancro
Quando um colega de escola ou amigo fica doente podem surgir sentimentos de tristeza, dúvida, medo ou até raiva. Abordar alguns destes pontos poderá ajudar a esclarecer as dúvidas da criança e dar-lhe algum conforto nesta situação.
Comece por desmistificar o cancro infantil, explicando que as suas causas não estão relacionadas com o estilo de vida, e que não foi um comportamento errado da criança que a deixou doente, sensibilizando também para o facto de não haver nenhum risco de contágio.
A honestidade é fulcral para explicar todo o processo aos mais novos, e estes compreenderem as mudanças pelas quais o seu amigo irá passar, como o maior cansaço, menos disponibilidade para brincar ou mesmo a perda de cabelo em resultado de eventuais tratamentos.
O foco deverá estar na amizade, que não muda apesar do cancro, incentivando a que relação com o amigo se mantenha, sem mudanças de atitude ou preconceitos, mas com maior paciência e compaixão pelas mudanças que este terá de enfrentar.
- Quando um familiar próximo é diagnosticado
Após a criança ser informada, é fundamental envolver adultos que lhe estejam próximos, sejam familiares, amigos da família, vizinhos, professores e técnicos da escola ou de outros espaços que a criança frequente.
É importante criar uma rede de apoio que vá além da unidade familiar de forma a reforçar os sentimentos de segurança da criança. Desta forma, outras pessoas envolvidas no dia a dia da criança poderão estar atentas ao seu estado de saúde mental – estando alerta para potenciais sinais de ansiedade ou mudanças de comportamento – ou até caso esta sinta necessidade de expressar sentimentos que não está confortável em expor no seio familiar.
- Quando a própria criança recebe o diagnóstico
Mais uma vez, a transparência é essencial para que a criança se sinta segura e envolvida no seu processo de tratamento e recuperação.
Nesta etapa, a equipa médica e assistente social das entidades de saúde serão um apoio crucial para orientar como dar a informação e prestar apoio aos pais e à criança, esclarecendo dúvidas e encaminhado a família para os vários sistemas de apoio disponíveis.
A mensagem deve ser honesta, sincera, mas otimista para aliviar o sofrimento emocional do peso do diagnóstico.
Orientações sobre como falar com a criança
Apesar de não existir uma receita única sobre como falar sobre cancro, apresentamos algumas sugestões que poderão ajudá-lo neste processo, deixando espaço para a criança colocar questões e assimilar a informação que lhe é dada:
- Explique a realidade à criança e o que pode esperar durante a realização dos tratamentos;
- Incentive a criança a falar abertamente do que sente e do que receia, consigo ou outro adulto de referência;
- Esteja atento a alterações de humor e comportamento;
- As explicações sobre a doença devem ser simples e honestas, recorrendo a recursos didáticos se necessário para melhor compreensão;
- Assegure sempre à criança que apesar as mudanças, esta terá sempre alguém a cuidar dela;
- Incentive a criança a manter a sua rotina diária, seja a prática de desporto ou outra atividade extracurricular;
- Recorra a apoio psicológico, para si e para a criança.
Conteúdo revisto
pelo Conselho Científico da AdvanceCare.
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